Essa condição genética que afeta a coagulação do sangue pode aumentar em duas vezes o risco de problemas cardíacos em homens
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A hemofilia é uma condição genética rara que afeta a coagulação do sangue. Os pacientes com hemofilia têm uma tendência aumentada a sangrar por períodos mais longos do que o normal, mesmo por lesões ou traumas leves, o que pode causar impactos no coração e no sistema cardiovascular.
Segundo dados da Federação Mundial de Hemofilia, o Brasil ocupa a quarta posição em termos de quantidade de pacientes com hemofilia em todo o mundo. O Dia Mundial da Hemofilia é celebrado em 17 de abril, e a data é uma oportunidade para aumentar a conscientização sobre essa condição genética rara, promover o acesso ao tratamento e apoiar a comunidade hemofílica em todo o mundo.
Neste texto vamos explorar os efeitos da hemofilia no coração, os riscos cardiovasculares associados e as estratégias de manejo para pacientes com essa condição. Continue lendo e saiba mais.
“O termo hemofilia mais comumente se refere a um distúrbio da coagulação devido a alterações genéticas inéritas, ou seja, herdadas. As alterações genéticas geram reduções na produção de fatores da coagulação gerando risco de sangramento”, descreve a médica hematologista Dra. Juliana Vassalo, que atua como hematologista no Hospital Niterói D’Or e na Oncologia D’Or.
“A hemofilia afeta mais de 1 milhão de pessoas no mundo, sendo a maioria homens. As hemofilias A e B são condições quase exclusivamente masculinas, pois são alterações genéticas que afetam o cromossomo X. Elas ocorrem aproximadamente em 1 em cada 4.000 e 1 em cada 20.000 homens, respectivamente.”, aponta.
De acordo com a Dra. Juliana, as mulheres podem ser portadoras dos genes da hemofilia sem apresentar sintomas ou com sintomas leves, e seus níveis de fatores de coagulação geralmente se aproximam da normalidade.
Ainda segundo a especialista, a deficiência do fator XI (onze) atinge tanto homens quanto mulheres, porém é mais rara afetando aproximadamente 1 em 1 milhão de indivíduos. “Ela é mais frequente entre descendentes judeus do leste europeu”, aponta.
Como as hemofilias são condições que geram a deficiência de fatores que atuam na coagulação sanguínea, os principais sinais são:
Dra. Juliana destaca que, dependendo da gravidade da deficiência dos fatores, esses sangramentos espontâneos podem se iniciar já no primeiro ano de vida. “Em casos mais leves, nos quais há uma maior produção do fator da coagulação, os episódios de sangramento podem aparecer na vida adulta após uma cirurgia”, exemplifica.
A médica hematologista explica que o diagnóstico da hemofilia é realizado através da história clínica e familiar de sangramentos com uma dosagem baixa dos fatores da coagulação VIII, IX ou XI.
“A suspeição diagnóstica se inicia pelo aumento de episódios de sangramentos. Como trata-se de uma condição herdada, uma história familiar positiva ajuda muito no raciocínio diagnóstico”, relata.
Para confirmar a doença, testes de coagulação são realizados, através deles é possível identificar também o tipo de hemofilia e sua gravidade. “A maioria dos pacientes apresentará uma alteração no coagulograma com prolongamento do exame de tempo de tromboplastina parcial ativado (TTPa)”, explica a médica.
Quando o resultado do TTPa é prolongado, isso indica que o sangue leva mais tempo do que o normal para coagular.
Dra. Juliana ressalta a importância da realização de um hemograma para avaliação das plaquetas, pois estas geralmente permanecem normais nas hemofilias. A médica destaca que qualquer alteração nesse aspecto pode sugerir a necessidade de considerar outros diagnósticos além da hemofilia.
“Também serão realizadas as dosagens dos fatores VIII, IX e IX demonstrando uma redução quantitativa deles. Além disso, testes genéticos são indicados na maioria dos casos para avaliação das variantes familiares”, aponta.
Com o aumento da expectativa de vida e o envelhecimento da população, juntamente com mudanças nos hábitos alimentares e sociais, além do aumento de fatores de risco como hipertensão, obesidade e sedentarismo, tem ocorrido um aumento na incidência de doenças cardíacas entre os pacientes com hemofilia.
“Estudos recentes mostram um risco 2 vezes maior de doença arterial coronária e fibrilação atrial na população masculina com hemofilia comparado aos sem a doença”, aponta a Dra. Juliana Vassalo.
No coração, a hemofilia pode ter vários impactos, especialmente se não for adequadamente tratada e acompanhada.
“Além disso, esses pacientes têm um risco maior de necessidade de receber transfusões de hemoderivados com risco de sobrecarga volêmica, por exemplo”, ressalta.
A médica hematologista destaca que os pacientes portadores de hemofilia estão sob risco maior de sangramento. “Em contrapartida, a terapia padrão para muitas cardiopatias baseia-se no uso de medicações antiplaquetárias e antitrombóticas, além de procedimentos cirúrgicos como angioplastias, colocação de stents, cirurgias cardíacas com necessidade de circulação extracorpórea, hipotermia etc. Tais terapias aumentam o risco de sangramento nessa população principalmente nos pacientes com hemofilia moderada e grave.”
Dra. Juliana ainda destaca que apesar de ser uma condição hemorrágica, a hemofilia não protege os pacientes de desenvolver ateromatose, angina, infarto agudo do miocárdico e eventos trombóticos, o que gera um desafio no manejo desses indivíduos.
“O cardiopata com hemofilia torna-se muitas vezes um desafio para a equipe médica e uma abordagem multidisciplinar deve ser objetivada. Existem alguns guidelines para o manejo principalmente das terapias antiplaquetárias, uso de anticoagulantes nesses pacientes e procedimentos invasivos”, explica.
Assim, tanto o tratamento da cardiopatia quanto da hemofilia com reposição de fator e alvo da terapia são individualizados, levando em consideração o risco de trombose e da gravidade da hemofilia. “Por exemplo, em caso de síndrome coronariana aguda, a trombólise deve ser evitada dando preferência à angioplastia. O uso de heparina não fracionada se mostra mais seguro e é recomendado no lugar da heparina de baixo peso, que é amplamente utilizada”, destaca.
Os scores de avaliação de risco de sangramento utilizados em pacientes com fibrilação atrial não são validados para hemofílicos, assim, em geral, indivíduos com hemofilia grave não devem receber anticoagulantes.
“Em caso de cirurgias cardíacas, essas devem ser realizadas em centros especializados no tratamento de hemofílicos, equipe multidisciplinar deve ser envolvida para um procedimento seguro, com reposição e monitoramento de fator da coagulação pré, intra e pós-operatório”, complementa.
É essencial que os pacientes com hemofilia recebam cuidados médicos especializados, incluindo monitoramento cardíaco regular e tratamento preventivo, para gerenciar de forma eficaz os riscos cardiovasculares associados a essa condição genética rara. Agende uma consulta com um cardiologista e hematologista da Rede D’Or.